DJs que são também produtores. Ora aí está uma linhagem mais rara do que se poderia pensar no hip hop, tanto dentro como fora de portas. Jazzy Jeff será uma das primeiras referências sérias. E depois há o imbatível DJ Premier. Ou DJ Shadow e Cut Chemist. Mas a maior parte, dedica-se em exclusivo a uma ou outra arte. Kanye é visto sobretudo como produtor, tal como Mixmaster Mike é visto antes de mais nada como um DJ. Os Beastie Boys que o digam. GI Joe é DJ. E Sickonce é produtor. Só que, ao contrário dos outros exemplos citados, GI Joe e Sickonce são igualmente uma e a mesma pessoa.

Rafael Correia é o nome por trás dos alter-egos, arquitecto de profissão e arqui-inimigo da música sem groove, sem punch e sem bombos e tarolas cortantes. Este nativo de Portimão é desde cedo – finais dos anos 90! - membro activo da particular cena hip hop algarvia, com um currículo que se alarga de Twism aos Tribruto, e isto para citar apenas projectos da região mais a sul do território nacional.

Como DJ, no entanto, G.I. Joe não se tem limitado a riscar discos em trabalhos alheios – além dos citados podemos encontrar os seus cortes precisos e carregados de flow em álbuns de Royalistick e Reflect, por exemplo – mas também a dar trabalho extra aos sistemas de som de clubes um pouco por todo o país. Nas cabines, o trabalho de G.I. Joe é igualmente eclético, sempre em busca do mais recente «banger» capaz de agitar as multidões, com um estilo aberto onde o hip hop facilmente encontra o dubstep, mas onde o bom gosto impera sempre. Exemplo claro: o duo Bass Avenue que mantém com Kombo e que explora o espectro mais grave das frequências pensadas para os clubes.

No reverso desta medalha encontra-se o trabalho como Sickonce. Como é óbvio, cada uma das facetas influencia a outra: quando os olhos observam a pista de dança concluem quase sempre o que é que funciona, que linhas de baixo fazem mover os corpos, que sons despertam as melhores reacções nas pessoas. E esse privilegiado posto de observação do DJ é depois transportado para o estúdio onde todas essas descobertas são postas em funcionamento. Os beats que Sickonce produz são originais, poderosos, com um som cuidado e de vistas totalmente abertas. O exemplo mais recente é o seu trabalho de produção extremamente bem cuidado no álbum de Deep:her, projecto que mantém com emmy Curl e que acaba de se estrear em formato grande. Mas Sickonce tem uma discografia mais vasta, incluindo o mega-projecto Palavra de Músico, em que se aventurou na produção de mais de meia centena de faixas com diversos convidados. Um marco na história «do it yourself» do hip hop nacional.

G.I. Joe e Sickonce, aliás, são duas identidades associadas a uma das mais activas células do hip hop algarvio e nacional, a Kimahera, casa de ambiciosos projectos, com uma identidade própria e já com vários anos de existência que muito tem feito para manter o hip hop no mapa musical nacional. Rafael é um dos homens do leme da Kimahera.

Em comum, G.I. Joe, Sickonce e, porque não?, o arquitecto Rafael Correia têm uma paixão por construções sólidas e fluídas, seja um set alicerçado em clássicos mas com um claro toque moderno, sejam beats sustentados por uma forte fundação rítmica, sejam edifícios em tijolo e cimento construídos para durarem gerações. Só assim se constrói o futuro. O da música e o do país.

Rui Miguel Abreu Read more on Last.fm. User-contributed text is available under the Creative Commons By-SA License; additional terms may apply.